"Meu livro e meu diário interferem um noutro constantemente. Eu não consigo separá-los. Nem consiliá-los. Sou uma traidora com ambos. Sou mais leal ao diário, porém colocarei páginas do me diário no livo, mas, nunca páginas do meu livro no diário, demonstrando uma fidelidade humana à autenticidade humana do diário" ANAIS NÏN

sexta-feira, 13 de novembro de 2009

A janela

Admito minha morte, mais do que a do outro. Encaro com angustia o fim da minha existência, mas com total desespero a morte do outro. "Um novo tempo apesar dos perigos".

É um (re)começo. Destes vários que a vida promove. Uma nova vida dentro da mesma. Mas desta vez é definitivo, é inteiro e maciço. É o meu para sempre. Sinto tudo por inteiro, o que me exaspera, me consome, me extrapola e me encanta.

Não sou mais um ser apartado e dividido. Não sou mais bipartida, um ser em dois estados. Não estou em estado algum. Não estou mais cristalizada em passado ou futuro. Me crio a todo instante, exatamente sofrendo daquilo que nos retiram (ou tentam retirar pela sociabilização) a nossa capacidade de sermos deuses em nossas vidas. É a revolução criativa. Não quero e não serei mais um pepino em sua conserva cultural, mas algo multiplo e amorfo. O que soa tão ironicamente em tempos que moda e corpo quase ditam como vc deve ser, como se comportar e algumas vezes até como sentir o que bebe e o que come. Me recuso, me revolto e me rebelo desta forma.

Eu gosto de opostos, dispostos e nada de pressupostos. Sou semelhante a uma intuição, ou sou vivendo ou não sou me iludindo. Quero sentir o sentimento sendo o próprio. Não desejo mais vigias e nem grilhões.

Sou o ser livre que sempre desejei. E me oprime qualquer contra manifestação disso.

Portanto, decidi (e antes das famosas promessas de ano novo) que me livrarei de ambuiguidades de minha vida. Sei que não posso me livrar de todas, mas farei com que elas sejam mais produtivas em termos de existência.

Odeio e sempre odiei qualquer coisa que fosse o jargão: "o que os outros vão pensar..." ou "como vou ficar diante..." Me sentir vigiada, me sentir tolhida em meu espaço, e pior ainda ele sendo virtual... não quero. Deixo de lado, para trás e afastado de mim, mas jamais renegado este pequeno diário virtual.

Escrevi este blog num estado específico de minha vida, de minha história e fez parte daquilo que me faz uno. Há várias cartas escritas para o mar. Este agora que contemplo e me faz ser uno. è o movimento de casar, unção com o mundo. O meu mundo. O meu horizonte de existência.

Não sou uma sereia, nem uma ninfa, e nem mais menina. Me torno agora um ser híbrido em um abraço eterno.

Eu quero estar disposta e intensa. Quero me dedicar em existência a outras coisas. Fechar gestalts, para abrir outras.

Sei escrever. Acho. E por isso me desvencilho da tecnologia (isso não é apenas porque meu computador tem Inteligencia artificial e joga fora minha tese e/ou por causa do apagão em SP nesta semana). Mas não quero mais digitar e as palavras quase estarem prontas. Às vezes nem são as que desejo, as que eu quero. Mas vão. Acabam sendo. É uma imposição de expressão, assim como regras de etiqueta, pura homogenização. Um traço de mim concorda, buscando o rasoável. E como isso é medíocre. Não quero isso para meus textos e nem para mim. Eu não quero escrever o rasoável, pq eu não sou uma pessoa rasoável, muito pelo contrário.

Não procuro escrever uma carta de despedida, um bilhete ou lista de compra ou afazeres. Quem sabe a composição quase escolar sobre o que não fiz, sobre o que não vivi? Isso será um pequeno segredo. Como uma dupla face, posso e quero. A vida pertence a mim e não aos outros.

Vou me dedicar ao inexplicável. Ao que ninguém sabe, nem eu. Sobre o que escrevo de próprio punho, e quem sabe coloque em letras normais ou eu admita realmente o seu "aprisionamento" em um de meus diários. Deixar meus hieróglifos manuais em paz. Não tenho mais a pretensão de fazer alguem entender o que não entendo. Porque isso se tornou um meio de vigilância. Queria apenas transmitir sentimentos.

Quero sorrir, neste momento, mas não consigo. Mas estou em paz. Paro antes que tudo isso se torne algo perverso. Perverso no melhor estilo psicanálitico, uam inversão completa da libido. Por isso, não me sinto culpada por terminar algo. E nem por não estar gargalhando. Não tenho a obrigação maníaca de estar sempre feliz. Isso é quase um desespero. Estar sorrindo e gargalhando o tempo todo. Existem outros estados que não são apenas felicidade e tristeza. Não há só o branco e preto, e entre eles o cinza. São as cores que nos dão a forma. As palavras são o leve rabisco de algo. Mas parece que minhas emoções estão gagas, inseguras e por isso vão se calar, silenciar neste espaço. Não sei se para sempre. Mas para um hoje bem prolongado.

Esta é a minha manifestação diante da descoberta da finitude. Do irreversível. Tenho medo. Não de mim, mas da inexistência do outro. E é por ele que me entrego mais e mais. Fico as vezes sem rumo, porque o limiar antigo, não serve. Ainda bem...

Dou meu ultimo salto aqui. Há morte. Há sentimentos ruins. Há pessoas não de bem com a vida.

Não quero. Bato o pé. Sou assim mesmo, teimosa e indomável. E não vendo limites, apenas horizontes.


"Não há como não pensar na morte,

entre tantas delícias, querer ser eterno"

(Adélia Prado)

sexta-feira, 2 de outubro de 2009

Dedico a voCê

Há de se comer do banquete sem se perguntar qual seria a entrada, o prato principal ou mesmo a sobremesa. Beba. Coma. Desfrute. Não se importe com os temperos. O prazer esta no destempero, no inesperado. Isto é mais uma daquelas resoluções pseudo intelectuais, e que na verdade apenas refletem o que tomo para mim como uma realidade mais do que psíquica, mas uma estética de vida. Sim, tenho muito pouco falado de vida. Pois, tenho a necessidade e a urgência de vivê-la. Me escondo numa toca, como um coelho. Mas não assustado, apenas a espreita, sabendo que em algum momento meu esconderijo pifará e terei que assim estar exposta. Mais do que já estou.

Destes dias que já quase parecem um mês, escrevo estas mal traçadas linhas. Não exatamente porque queira, mas porque haja interrogações no ar. O que isso quer dizer que existem perguntas. Fique atento agora porque vou falar sobre os pequenos mistérios cifrados aqui. Coloco, exponho, rasgo em palavras frias de um monitor. É uma pequena experiência mística, mítica, misteriosa. Assim como meu rosto é meu inconsciente. Sei que existe, mas apenas posso sabe-lo por percepção de minhas mãos, e sua manifestação, talvez num espelho. Agora me utilizo do Outro como meu espelho, aquilo que reflete o que de mim há de inconsciente.

Vai te preparando, a coisa vai longe... talvez não em expansão, mas em saltos, pequenos e grandes de idéias... em devaneios...

Me disponho a falar de algumas coisas. Concordo! Concordo que há em algum momento tenho que me esvaziar de significados para adquirir outros. Mas algo me diz que isso já não pode ser mais desta forma, há um outro movimento em mim agora. Trabalho com uma mudança muito abstrata e sutil, que em suas manifestações internas é poderosa e rearticuladora. Não sei bem ao certo que fascínio é este que me domina. É quase uma insanidade que brilha em meus olhos o tempo todo. Destempero. O destempero que tempera a minha salada.

Vivo em curto circuito com o mundo. Ou melhor vivemos. Estamos em relação. Em algo tão profundo, que se funde. Nosso tempo. O nosso tempo, apenas nosso e vemos momentos em relógios enlouquecidos na cidade insana... Mais uma comprovação de que vivemos na dobra do momento criador e no momento do encontro. Na esquina.

Nós que atravessamos ruas, por vezes sozinhos ou acompanhados. Por vezes solitários em companhia e acompanhados por um eu-com eu mesmo- em mim mesmo. A questão é que por vezes, pessoas tiveram que atravessar ruas e dobrar as esquinas da existência. E nós continuamos andando. Até que... num momento, numa dobra, sem ter que atravessar nenhuma rua, esbarramos na esquina. E estávamos indo na mesma direção. E agora continuamos. Sem atravessar ruas e pouco ligar para os sinais de pare e atenção. Tudo se torna um grande sinal verde.

Por isso somos realização, somos vivos, somos experiência, somos aquilo que não se pode pegar, somos mutantes em nós mesmo. E nosso encontro será para sempre meta livre. Sabemos que somos dois, mas por uma capacidade única, conseguimos estabelecer uma relação profunda. Conseguimos uma bi-empatia, toda nossa sensibilidade está ativa para o outro. Conseguimos nos perceber e por isso nos relacionamos, sem a arrogância de saber o que se passa com o outro, temos consciência da nossa limitação, o que nos dá ilimitação de experenciar.

Não há nada a ser esperado, é o inesperado que pulsa a vida. É assim foi o encontro numa esquina, não qualquer, mas aquela. Só aquela. Eu não fui até você, e nem você veio até mim. Não se forçou nada. Cada um tem e teve e terá seu processo. Conheci para ser conhecida, me abri para abrir o sorriso alheio. O desejo é o alimento. E nele estou me fartando.

O que há de se fazer? Afinal, há o que fazer? Algum ato gerador ou que corte que promova qualquer coisa... qualquer coisa.... redijo cartas num editor de textos... sinto toda a reversibilidade que a vida não tem. Sinto que num teclar posso voltar atrás em palavras que disse, na vida não... nem mesmo o ato encima do teclado é reversível, apenas o que foi provocado pelo mesmo... ao contrário da boca. Se mexe, fala e não há como remediar.

Não faça nada, ou melhor faça tudo. Faça tudo sentindo o mundo e devolvendo a ele a sua energia, pulse sobre as coisas, pessoas, objetos. Sobre vc mesmo. Não encare isso como narcisismo. È apenas mais um devaneio. E são nos devaneios que conseguimos nos alinhavar em sonho, realidade e fantasia. Isolando as pressões... o que se quer realmente? Fale para si mesmo, o que vc não quer escutar. Seja o seu melhor Outro. Sangre absurdamente, faça esta entrega solitária, talvez seja a única coisa que nos salve desta apatia que nos mata. Não tema em ser louco, ser louco é não se entregar a vida. Pague o preço da vida, ou estará para sempre amarrado a uma imagem fake, nem mesmo “refletível” num espelho.

Ignoro por vezes o impacto de mim sobre o outro. Talvez porque meu espelho esteja opaco. Novamente: espelho opaco. Não, não é o espelho opaco, mas o que meus olhos míopes tem dificuldade de discenir. Os meus olhos que estão acostumados a não me ver refletida no outro. È exatamente o inverso do narciso. Nego o espelho, não porque seja ruim, mas porque não estou acostumada a felicidade da reciprocidade. Porque não quero lidar com as idealizações, com as minhas próprias (que tento ... riam... de forma racional e ponderada) e as idealizações dele. Estas segundas que tanto temo em falhar, mas não sou massa de modelar. E nem ele quer.

Mas me faço passar por pequenos testes de crueldade, de mim para comigo mesma. Por que assim, provo para mim a minha fantasia de que sou uma rocha. De que nada me atinge e que tenho compreensão suficiente para que sustentar. Mas é apenas um devir rocha. Aguentar a arrebentação é tudo que quero. Mas nem sempre é possível. Por isso necessito tanto de algum ponto de segurança. Pela primeira vezes o ponto de segurança é exatamente o que me confere a insegurança.

Digo isso, porque sei que o objeto (ser amado) se sobrepôs às imagens. Assim é o início da paixão. Ele é o meu desejo e assim se configura, assim como eu sou o desejo dele. E com certa melancolia abstrata esqueço dos limites, para assim fugir de qualquer tipo de desemparo que possa ser criado por minha fantasia. Pq não estou desemparada, não mais no sentido freudiano. Tenho noção da minha solitude, e agora tenho um companheiro de solidão. Alguem que fico em silêncio. Alguem para o tudo e o nada. Parece tudo um tanto quanto blue... mas não é... é sereno, ao mesmo tempo que é impetuoso. Meu amor não é algo que venha sozinho... está junto com tudo isso e muito mais. Coisas que não há palavras para.

Por isso, não invisto em minha idealização como “ser amada”, mas invisto nesta melancolia, que paradoxalmente é narcísica. Com este peso em minha alma não saio flutuando em minha leveza maniaca, e assim consigo entender também os desabores daquele que quero só os sabores.


quinta-feira, 3 de setembro de 2009

Por que hoje é sábado

Depois de tanto tempo fora do blog, vivendo talvez, um pouco mais da realidade. Estou cá novamente. A vida cheia de retornos, novos caminhos, aventuras e desventuras. Trilho hoje um novo caminho, com algumas mesmas metas, mas principalmente com um novo pensamento: por que hoje é sábado.
Esta nova "ideologia" vem de um novo propósito de vida, nada que vá muito além do que já havia proposto dentro do "projeto para uma vida melhor". Mas me livro aos poucos de pequenas mesquinhezes, coisas que apenas me faziam sofrer, mas viver o que otimistamente desejo: viver a vida.
Certa vez uma amiga de infancia disse a mim: "a vida foi feita para ser envolvida na vida de outra de vida. Se minha vida não é envolvida na vida de outra vida.... Poxa vida, isso é vida... "
Além de ter uma vida envolvida na vida de alguem, é necessário também se envolver com a vida que nos circula. Por mais dores que isso possa causar em algum momento, expectativas não cumpridas, preconceitos desafiados, valores colocados em xeque, sentimentos disperdiçados... nada é maior do que a delícia de se estar vivo e poder passar por tudo isso.
Hoje, especificamente, depois de um inverno rigoroso em SP cinza, vejo o céu azul e posso voltar a usar minhas saias floridas. Creio ser a primavera que se aproxima e toda a delicadeza do mes de setembro. Mes este que contempla as pessoas mais delicadas e amadas que tenho aqui em SP. Pessoas de terra, pés no chão, mas que me fazem sonhar, que contem o fogo de minha existencia sempre com generosidade de um amor profundo. Não importando a sua manifestação.
Amo meus virginianos. Do fundo do meu coração e eles sabem disso.
Falo tudo o que há de bom. Mas há também aquilo que não é bom. Para vida, também há morte. O ultimo post, falei da morte de um desconhecido. Agora falo da morte de alguem conhecido. Alguém que em muito influenciou minha vida e minha trajetória. Hoje em sua linguagem seria um dia com "céu de brigadeiro", o que lindamente ele descreveu para meu pai no dia de minha formatura.
Presto aqui uma homenagem singela ao meu primeiro orientador, Prof. José Luiz Guimarães. Uma pessoa ímpar, de opiniões fortes e sem qualquer medo de expressa-las. Um pequisador nato e um gestor de idéias. Tive em minha graduação a sorte de lidar com dois grandes gestores de idéias. Ambos mortos. Zé Luiz e Glória. O que me entristece, quem sabe, em algum momento nestas dobras de vida e morte, eles possam ver onde estejam o quanto o menor ato foi transformador. Isso me faz ser aquilo que tento ser não apenas em sala, com meus amigos, com a pessoa que anda comigo, mas na vida. Neste grande palco de dramas, comédias e aventuras. tudo é passivel de ser transformado. tudo. Até mesmo a morte, aquilo que parece ser irremediável.
A vida e a morte. para sempre a mesma questão de existência.
Por isso, decido como lema : Por que hoje é Sábado! - lema este dado por um viriginiano mto amado por mim.
Não me isento das responsabilidades, assim como o sábado, mas quero viver dias ensolarados. Quero um sorriso sincero e não gargalhadas desesperadas e alienadas. Quero meu olhar longo a procura de um horizonte que vejo sua infinitude, e não algo idealizado. Quero em meu peito esta paz que faz cócegas, e não o peso da angustia de persecutoriedade. Quero abraços verdadeiros e não beijos falsos sociais. Quero o olhar sincero e não a piada bem colocada. Quero o simples e não o que se esconde atras do espetáculo. Quero apenas pq sou um ser desejante, e não desejo ser outra coisa.
Por isso, exatamente, um mês após meu retorno de saturno, declaro meu DIA DA CRIAÇÃO....

O dia da criação

(Vinicius de Moraes)

Macho e fêmea os criou.
Gênese, 1, 27

I


Hoje é sábado, amanhã é domingo
A vida vem em ondas, como o mar
Os bondes andam em cima dos trilhos
E Nosso Senhor Jesus Cristo morreu na cruz para nos salvar.

Hoje é sábado, amanhã é domingo
Não há nada como o tempo para passar
Foi muita bondade de Nosso Senhor Jesus Cristo
Mas por via das dúvidas livrai-nos meu Deus de todo mal.

Hoje é sábado, amanhã é domingo
Amanhã não gosta de ver ninguém bem
Hoje é que é o dia do presente
O dia é sábado.


Impossível fugir a essa dura realidade
Neste momento todos os bares estão repletos de homens vazios
Todos os namorados estão de mãos entrelaçadas
Todos os maridos estão funcionando regularmente
Todas as mulheres estão atentas
Porque hoje é sábado.


II


Neste momento há um casamento
Porque hoje é sábado
Hoje há um divórcio e um violamento
Porque hoje é sábado
Há um rico que se mata
Porque hoje é sábado
Há um incesto e uma regata
Porque hoje é sábado
Há um espetáculo de gala
Porque hoje é sábado
Há uma mulher que apanha e cala
Porque hoje é sábado
Há um renovar-se de esperanças
Porque hoje é sábado
Há uma profunda discordância
Porque hoje é sábado
Há um sedutor que tomba morto
Porque hoje é sábado
Há um grande espírito-de-porco
Porque hoje é sábado
Há uma mulher que vira homem
Porque hoje é sábado
Há criançinhas que não comem
Porque hoje é sábado
Há um piquenique de políticos
Porque hoje é sábado
Há um grande acréscimo de sífilis
Porque hoje é sábado
Há um ariano e uma mulata
Porque hoje é sábado
Há uma tensão inusitada
Porque hoje é sábado
Há adolescências seminuas
Porque hoje é sábado
Há um vampiro pelas ruas
Porque hoje é sábado
Há um grande aumento no consumo
Porque hoje é sábado
Há um noivo louco de ciúmes
Porque hoje é sábado
Há um garden-party na cadeia
Porque hoje é sábado
Há uma impassível lua cheia
Porque hoje é sábado
Há damas de todas as classes
Porque hoje é sábado
Umas difíceis, outras fáceis
Porque hoje é sábado
Há um beber e um dar sem conta
Porque hoje é sábado
Há uma infeliz que vai de tonta
Porque hoje é sábado
Há um padre passeando à paisana
Porque hoje é sábado
Há um frenesi de dar banana
Porque hoje é sábado
Há a sensação angustiante
Porque hoje é sábado
De uma mulher dentro de um homem
Porque hoje é sábado
Há uma comemoração fantástica
Porque hoje é sábado
Da primeira cirurgia plástica
Porque hoje é sábado
E dando os trâmites por findos
Porque hoje é sábado
Há a perspectiva do domingo
Porque hoje é sábado


III

Por todas essas razões deverias ter sido riscado do Livro das Origens,
ó Sexto Dia da Criação.
De fato, depois da Ouverture do Fiat e da divisão de luzes e trevas
E depois, da separação das águas, e depois, da fecundação da terra
E depois, da gênese dos peixes e das aves e dos animais da terra
Melhor fora que o Senhor das Esferas tivesse descansado.
Na verdade, o homem não era necessário
Nem tu, mulher, ser vegetal, dona do abismo, que queres como
as plantas, imovelmente e nunca saciada
Tu que carregas no meio de ti o vórtice supremo da paixão.
Mal procedeu o Senhor em não descansar durante os dois últimos dias
Trinta séculos lutou a humanidade pela semana inglesa
Descansasse o Senhor e simplesmente não existiríamos
Seríamos talvez pólos infinitamente pequenos de partículas cósmicas
em queda invisível na terra.
Não viveríamos da degola dos animais e da asfixia dos peixes
Não seríamos paridos em dor nem suaríamos o pão nosso de cada dia
Não sofreríamos males de amor nem desejaríamos a mulher do próximo
Não teríamos escola, serviço militar, casamento civil, imposto sobre a renda
e missa de sétimo dia.
Seria a indizível beleza e harmonia do plano verde das terras e das
águas em núpcias
A paz e o poder maior das plantas e dos astros em colóquio
A pureza maior do instinto dos peixes, das aves e dos animais em [cópula.
Ao revés, precisamos ser lógicos, freqüentemente dogmáticos
Precisamos encarar o problema das colocações morais e estéticas
Ser sociais, cultivar hábitos, rir sem vontade e até praticar amor sem vontade
Tudo isso porque o Senhor cismou em não descansar no Sexto Dia e [sim no Sétimo
E para não ficar com as vastas mãos abanando
Resolveu fazer o homem à sua imagem e semelhança
Possivelmente, isto é, muito provavelmente
Porque era sábado.

sábado, 25 de julho de 2009

Chicobuarquiano, infelizmente

"morreu na contramão atrapalhando o trânsito"
Nunca uma frase foi tao verdadeira. Justamente num dia em que pensava sobre o carater da vida. Estava eu, com a minha vidinha e meus dramas egoistas, a pensar sobre o que se faz da vida que se tem. E para agravar a coisa, estava indo ao palacio da futilidade: o shopping.
Vi um homem. Só sei disso. Um homem. Com alma, ou seja lá, que nome queira dar para isso. Tentar atravessar a rua, antes do sinal ficar verde. Não conseguiu. Os carros, como estouro de manada zuniam seus aceleradores. Foi assim... bum.... primeiro achei que dois carros tinham passado mto rente, um ao outro. Mas não. Eu vi algo a mais sair do carro ou pular o carro. Era um homem.
Me escondi, vergonhosamente, atras da banca de jornal. Não suportava o espetáculo. As pessoas como matilhas, se aglomeraram na calçada. Pareciam sedentos da desgraça alheia. Daquele homem que naquele momento era o centro das atenções, na calçada de indigentes. Aquele que era para ser mais um transeunte na cidade que ferve de pessoas, tinha olhares fixados nele.
Assim que abriu o sinal para os pedetres. Corri. Sem olhar para lado nenhum. Fugia. Fugia do carater mais humano das coisas... morte e crueldade. Do outro lado da calçada adolescente irritantemente emos, riam. Ao entrar no shopping pessoas andavam. E eu só pensava no corpo extendido no chão. Me deu vontade de gritar. Dizer: _ Olha tem um homem morto lá fora.
Mas de nada isso adiantaria. Nada.
Outra vez, o carater solitário da existência. Será q alguem chora por aquele homem hj...
Talvez a existencia dele jamais teria sido percebida por mim, jamais faria sentido. Mas a sua morte teve um sentido, e um impacto. Algo se transformou em mim. Algo que para sempre ficará. Mesmo que algum dia eu esqueça, porque sou humana, a cena que vi hoje.

quinta-feira, 23 de julho de 2009

uma história real

A menina brincava interessada com a caixa. Com as pernas rechunchudas abertas, entre elas a caixa. Abria a tampa com um brilho mailicioso no olhar. As folhas coloridas pareciam ter um sentido interessante.
Grita para a tia: _ Me vê uma caneta!
A tia da cozinha em voz de surpresa: _ Para que queres uma caneta....
A tia pára de lavar a louça e aguarda uma resposta. A menina se cala, em silêncio pensa numa resposta. Uma resposta que não faça a tia brigar com ela. Dilema.
_ Lorena! Para que queres a caneta...-a tia pergunta ainda junto ao balcão da cozinha.
A menina apertta a caixa entre as pernas, fecha os olhos e diz: _ Tia tem folhas que precisam de letras. Só vou colocar letras no que não tem.
A tia pega o guardanapo de pano, enxuga as mãos, já prevendo o que está a acontecer na sala. E o presumido inevitável está lá.
_ Lorena!!! não podes mexer nesta caixa!!! Ela não é minha nem sua... ela tem.. um segredo...
_ Um segredo!!!! - e mais curiosa ficou a menina - tia... vamos ver o segredo, eu e você.
_ Lorena - explica a tia - o segredo assim como a caixa, não é nem meu, nem seu. É de Clara. Ela mora aqui. Ela ganhou de alguém...
_ É um namorado, tia...
A tia balança a cabeça, pensa na história da amiga e diz: _ É.... de alguem que foi namorado dela. E ele mandou a caixa com o segredo, para que abram juntos. O segredo é dos dois.
A menina olhou para a tia sem entender ao certo. Pareciam faltar pedaços à história.
O pai da menina se aproxima. E a menina com seus olhos perguntadores diz ao pai: _ Pai, nesta caixa tem um segredo. Mas a tia disse que só pode ser aberto por duas pessoas. Vamos abrir...
O pai animado quer entrar na brincadeira. E diz: _ Vamos - já avançando para a caixa, mas seu olhar cruza com o da tia, e compreende. Não é para abrir a caixa.
O pai diz a menina em muxoxo: _Quem sabe outro dia...
A tia complementa: _ É, Lorena, quem sabe qdo a Clara chegar... Você pergunta a ela, isso se ela já souber do segredo.
A menina olha para a caixa, para sua tampa colorida e os papeis coloridos esperando por letras.
Entrega para a tia em resistência e diz: _ tá bom... vamos esperar a Clara.
A menina vai embora sem encontrar Clara.
Clara chega e ruma direto para a cozinha. A tia estava lá e logo lhe conta o passado com a sobrinha. Clara ri. Pensa no que os olhos de menina achariam dos papéis lá dentro. Os olhos de menina que nada entendem ainda sobre o amor. Os olhos de menina que ainda tiveram suas primeiras lágrimas derramadas por amor. Os olhos de menina que ainda não teve seu primeiro encanto.
O momento do encontro entre Clara e a menina não tardaria. Logo que a menina entra no apartamento, pergunta para a tia: _ Onde está a Clara... Ela está em casa....
Clara fala do quarto: _ A descobridora de segredos chegou...
A menina aparece. Acanhada. Na porta do quarto.
Clara retoma a pergunta em tom de brincadeira: _ é tu que sabes dos meus segredos....
A menina responde, sem titubear, rapida e direta: _ Só o da caixinha... - e aponta para a mesma dentro do quarto.
Clara sorri. A menina a encara com toda a sua meninice. Mas as duas se comunicam, afinal, eram duas mulheres. Estava no olhar.
A menina podia não entender exatamente, mas sabia do que se tratava.
A menina pergunta: _ Ele gosta de ti...
Clara fica admirada com a pergunta.
A menina retoma e insiste: _ Ele gosta de ti... ele te deu a caixa.
Clara sente as faces ruborizarem, Pensa na carta recebida. E diz secamente e embarassada: _ Gosta.
A menina pisca e diz: _ não sei ler. Não li o que tinha lá. Mas é algo que só pode ser lido por você e ele ... vcs sabem ler oque está lá, ne!
Clara olha para os olhos vivos da menina e pensa:"as coisas são tão simples que até uma menina de pouca idade vê." Pára se se repreende: _ Tola sou eu. Sábia é a menina que ainda não tem os olhos sob os véus da mágoa, malicia e "esperteza".
A menina não precisava ler. Não são as palavras e caracteres, porque ela saber do coração em seu estado total e absoluto.

domingo, 19 de julho de 2009

Eu vou te Contar

Eu vou te contar que você não me conhece
E eu tenho que gritar isso
Porque você está surdo e não me ouve
A sedução me escraviza a você
Ao fim de tudo você permanece comigo
Mas preso ao que eu criei e não amei
E não a mim
E quanto mais falo sobre a verdade inteira
Um abismo maior nos separa
Você não tem um nome e eu tenho
Você é rosto na multidão
E eu sou o centro das atenções
Mas há mentira na aparência do que eu sou
E há mentira na aparência do que você é
Porque eu não sou o meu nome
E você não é ninguém
O jogo perigoso que eu pratico aqui
Busca chegar no limite possível de aproximação
Através da aceitação da distância
Ou do reconhecimento dela
Entre eu e você
Existe a notícia que nos separa
Eu quero que você me veja nu
Eu me dispo da notícia
E a minha nudez parada
Me denuncia e te espelha
Eu me delato
Tu me relatas
Eu nos acuso e confesso por nós
Assim me livro das palavras
Com a as quais você me veste.

[Fauzi Arap]

segunda-feira, 13 de julho de 2009

Triângulos, Retas e Pontos (o melhor conto que eu já escrevi)

Todos temos vontades e desejos. Vários sonhos, impulsos. Devir de ser uma coisa q tem a possibilidade de ser várias. Somos como massa de modelar, a cada escolha nos moldamos. Estas escolhas, por mais que pareçam erradas ou certas, são escolhas que não voltam para um cara a cara, ou teste para saber qual seria a melhor. Uma segunda chance. Ou movidos pelo orgulho deixamos de ver, ou começamos a ver coisa que antes eram invisíveis a nosso olhar.
Vaidade seria o nome deste orgulho. Vaidade não é apenas ficar na frente de um espelho se endeusando, mas criar uma crista, erguer o pescoço e se fazer de superior. Um cupido, uma Jezebel, uma Julieta, uma Isolda e um Socrátes. Estes cinco personagens estão intimamente ligados embora não como conhecemos. O cupido trata-se de uma ponte de ligação tentando semear o amor. Até mesmo entre personagens tão contraditórios, como os que estão expostos aqui.
Imagine como seria o amor de uma Jezebel e um Socrátes ou um Sócrates com uma Julieta. Estranho, esquisito, surrealista. Mas extremamente verdadeiro. Um Socrátes que se vestiu de Ulisses para uma Penelope, que por sua vez se vestiu de Rapunzel, ficando no alto de sua torre esperando o príncipe chegar. Uma Julieta que espera o seu Romeu e encontra um Sócrates.
A vida é assim. Triângulos que não se fecham, retas que não se completam. E o cupido? Por onde anda??? Aqui. Perto de você, é só você fechar os olhos que você sentirá o seu cupido. Ele está dentro de você. Mas neste caso o cupido saiu de dentro de cada um se personificando num jogo de projeções em uma Quinta pessoa.
Os cupidos são seres capazes de ver as coisas, mas com uma única vantagem em cima dos outros anjos. Ele pode interferir na vida alheia, com o poder de suas flechas. Que algumas vezes tem alvo certo e correto, algumas vezes não é tão correto, provocando rios de lagrimas. Às vezes quando um cupido não usa apenas suas flechas, as situações mudam complemente, gerando outras situações mais complexas.
Imagine um anjo profetizando a Sócrates o dia em que beberia seu doce cálice de cicuta. Mas para isso ele teria que se vestir de Ulisses para conquistar sua Penelope e assim concretizar a profecia. E isto acontece. Ele toma sua Penelope, e como tal entende que Ulisses deve partir. Eis q o cupido interfere novamente, fazendo com que o Ulisses retorne a Ítaca, mas sua Penelope já não existe, pois ela se tornara um personagem de uma historia qualquer.Isto faz com que Ulisses já deixe de existir e volte a ser Socrátes.
Um andarilho a procura de algo ou de alguém como supunha o cupido. Por muitos caminhos Sócrates andou, muitas pessoas ele conheceu em curto espaço de tempo. Mas uma pessoa que mais parecia um cometa riscando o céu, parou. Como Tristão quando encontra a sua Isolda, uma andarilha como ele, que andava pela estrada, um pouco perdida como ele.
Conheceram-se, se mudaram mutuamente. Algo mágico aconteceu, o filtro do amor foi bebido. Mas como andarilhos, tinham que continuar a andar, como aos pássaros que não conseguem viver sem rasgar o céu voando. Eles se separaram com a promessa de um dia se encontrarem e talvez andarem juntos. Por isso nosso Tristão deixa sua Isolda ir ao encontro de seu prometido.
Sócrates não se desvincula totalmente do seu papel de Tristão. Eis que surge o cupido novamente para lhe trazer uma Julieta. Uma pessoa com sede de amar, com o coração puro e intempestivo. Ela o envolve como uma golfada de ar, algo q desvia o caminho, que perturba. A intensidade das emoções de Julieta faz com que nosso Sócrates se confunda, se envolva, mas por pouco tempo.
A razão e a emoção não são compatíveis. Julieta vê em Sócrates seu Romeu, se encontra, fantasia. Entrega-se a isso. O romantismo latente de todo seu ser é vão, pois Sócrates ainda tem Isolda em seus pensamentos. Sente-se como um Lancelote, divido entre o amor e o que é certo.
Sente que não está sendo honrado, desaparece. Então sua Julieta chora dia e noite por seu pseudo Romeu. Pode vir o Príncipe Páris montado em seu corcel negro, mas ela não o quer. Apenas pensa em seu novo amor.
O cupido apenas acompanha o reaparecimento de Jezebel. Julieta vem em desespero lhe pedir auxílio, como Psique pede ajuda a Afrodite para ter Eros de volta. Mas diferente de Afrodite, Jezebel não dá nenhuma prova ou manda Julieta ao inferno com uma armadilha.
Julieta se encanta com o poder, com a beleza com todos os encantos que a princesa possui, mas sofre pelo julgamento feroz de Jezebel. Ela é dura, fria, julga sem piedade.
Julieta está perdida, como Psique acorrentada esperando que a morte venha. Seu príncipe Paris, nem mais príncipe é, mais parece um sapo. Seu espirito se agita, se contorce. Enquanto, Jezebel, mantém-se dura e fria, mas com um calor abrasador dentro de si mesma por sentir que perdeu para Julieta, resolve retomar Sócrates para se satisfazer.
Veste-se com seus trajes mais bonitos, organiza sua corte e vai embusca de Sócrates. Acontece algo interessante neste encontro. Dois se olham, olhos nos olhos, não há como fugir, um confronto direto. Uma loucura. Um brilho no olhar difícil de explicar. Mas muitas coisas acontecem nesta explosão.
Uma união no espaço. Os olhos brincam de se esconder e se achar, quando se revelam não se desgrudam, é magnético, é forte, é fascinante. Estão se reconhecendo. Eis que as mãos se procuram ávidas pelo espaço, pelo momento.
Jezebel não admite enfraquecer, seu orgulho está muito ferido, pois como pode ele a esquecer, se entregar a outra se não ela. E como sempre: dissimula a situação. Faz acontecer da maneira dela. Os toques se intensificam, se necessitam, aumentam, aumentam. Até que não dá mais para agüentar, o silencio melodioso deve ser quebrado aos sons das respirações ofegantes, algo cresce, algo se esquenta. As bocas se entreabrem se aproximam é selar uma comunhão silenciosa, um pacto.
O espaço se diminui e dois mundos se juntam. A ligação foi feita, como Jezebel planejava. Como chegou, Jezebel parte, deixando o pensador sozinho. Ela chega, transtorna e saí. Sócrates não entende, pede auxílio ao anjo. Mas este nada pode fazer, não pode interferir mais. É tarde demais, o grande estrago já foi feito. Fatalismo se apodera do anjo, eis uma grande semelhança com os humanos. Deixa passar.
Pois a impossível chance estava para acontecer. As coincidências estavam acontecendo. Tudo estava caminhando para aquilo que mais desejava. Saltaria para o acostamento com medo de que aquela luz no final da estrada escura fosse um caminhão, ou enfrentaria a colisão o impacto?
Por mais perguntas que se faça, estamos assim, anjos, humanos, santos, andando pela noite escura sob um asfalto gelado, apenas com os grilos e as estrelas como companhia. Esperando com um frio na barriga, com um suor frio, pelo momento da decisão.
Julieta ansiosa por um novo encontro, mas este não acontece. Ela fica no porto esperando o barco chegar. Mas ele apenas passa ao longe. Sócrates se decide a ser novamente Tristão, mas já havia passado muito tempo e Isolda já estava casada.
Sócrates deixa para trás sua fantasia, seu personagem. Pelo menos tenta, mas tudo mudou muito, está tudo diferente. Já não consegue mais ser Sócrates, mas uma mistura de todos os homens que foi, amando todas as mulheres que amou.
Mas o tempo está contado, os santos choram, os anjos se calam, Deus abençoa. Sócrates entendeu tarde demais o sentido da vida, mas consegui entendê-lo nos últimos momentos de vida. Pois esta descoberta lhe decretou a morte.
Não havia mais como ele viver. Sabia demais, as pessoas não entenderiam, não estariam prontas para a verdade. A cicuta é servida. Sócrates a bebe com gosto. O prazer de finalmente estar livre.
Julieta surge no momento em que Sócrates fecha os olhos. Ela se desespera. Ela sabia o que aconteceria, mas não teve coragem de enfrentar. E quando enfrentou, já não havia mais tempo. Sua bondade foi sua fortaleza.
Convocou cada uma de suas rivais. Cada uma das mulheres que Sócrates amou, seu último gesto de amor, uma desvinculação. Ao mesmo tempo em que sentia que algo havia sido lhe tirado, sentiu que algo retornava para si. Sócrates lhe deixou seu coração, ela o guardou. Sentiu que ele havia cuidado muito bem, mas que não era seu, por mais que tenha lhe sido fiel. Aquele coração não era seu.
No enterro Julieta se fez forte, como nenhuma Deusa do Olimpo jamais seria. Enquanto Jezebel dedicou a morte de Sócrates a sua pessoa. A vaidade lhe cegara como também lhe devolvera um castigo a altura.
O único homem que lhe tomou, que lhe desviou por alguns momentos do seu caminho, já não existia. O único a entender a sua natureza. Sendo assim sentiu no completo direito de ter o coração apenas para si.
Julieta lutou bravamente. Chegaram a se esquecer do que se tratava para estarem brigando. De coração passou a ser um objeto a ser conquistado. Um briga, uma guerra sob o corpo de Sócrates.
O cupido infere. Tira o coração das duas. E o leva para aquela que Sócrates realmente amou. Não aquela que lhe foi mais fiel ou mais desafiadora. Mas para aquela que simplesmente partiu seu coração.
O cupido atravessou, mares, terras, vilas, cidades, países. Até que encontrou Isolda, parada olhando o céu de sua janela, enquanto tricotava um sapatinho de bebê. O cupido entra delicadamente como o raio de sol e lhe entrega a caixa q tem o coração.
Isolda chora. Não por si, nem por Sócrates. Mas pelo mundo. Pelas pessoas que deixam de ser felizes como ela por preencherem suas vidas com areias e não com plantas e vida, apenas preenche o ser e não pela vida. Ambição, inveja, vaidade que cegam, impedindo que os sentimentos se aflorem, que as almas se encontrem, não os disfarces produzidos. Tantas coisas que deixam de serem vividas.
As três mulheres, os três ícones de cada mulher. Cada mulher tem um pouco das três dentro de si. Todas chorando pela perda de seu amor. Por que neste instante não havia dobrado a esquina uma pessoa, mas três. Mais um mundo deixou de existir. Mais uma história se finda. Pode ser fictícia ou não, mas este mundo agora se finda... é inevitável.

domingo, 12 de julho de 2009

Num dia frio, um bom lugar para ler um livro, o pensamento lá em você

"Ler um poema é como mergulhar nele em pensamento. O poema é objeto e pensamento ao mesmo tempo. E, ao contrário do que ocorre nos não poemas, no poema não é possível separar o objeto do pensamento ou do sujeito do pensamento. Aquilo que pensa no poema é também a sua materialidade linguística: não apenas os seus significados convencionais, mas os seus significantes: e os significados não se separam, no poema, dos significantes. Nada, nele, se separa de nada; nada se parte; nada parte."

(Enquanto não lemos poesia, não partimos - Antônio Cícero)

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quinta-feira, 9 de julho de 2009

Conversa de Meninas Pós Modernas e que usam msn

D says:

Oi, Lau! Que lindo seu blog Ameeeei

Simplesmente, Lauren says:

Como assim? Gostou?

D says:

acabei de abrir, pq nao conhecia...linda a foto, linda a diagramação... e isso que nem deu tempo de ler nada ainda

Simplesmente, Lauren says:

eu tenho escrito desde o inicio do ano. São os textos que geralmente ficavam aprisionados no meu diario

D says:

vc devia ter divulgado antes

Simplesmente, Lauren says:

Tudo tem o seu momento. Os textos devem e são escritos para alguém. Escrever por apenas escrever torna-se vazio. O remente faz com que os textos aconteçam. È o entre duas pessoas. È a minha forma de expressar aquilo que não é possivel de expressar de outra forma. Sempre procuro novas formas, nem sempre são bem sucedidas. Quem recebe o texto, nem sempre entende as entrelinhas. E quando entende, tem a chave da minha alma e do meu coração.

D says:

entendo... vc queria mantê-lo em segredo até amadurecer a idéia, não foi?

Simplesmente, Lauren says:

Escrevi coisas mto bonitas para ele. Não era questão de amadurecer, mas pq eu achava que eram ruins. Até que eu encontrei alguem, que gostou dos meus textos.

Descobri, acho que tardiamente, o que é paixão. È uma coisa a ser construída. Construída entre o estado delicado das coisas que quero e das que não quero. É uma projeçao. A paixão busca este estado de perfeição. E de certa forma, nossos pais servem para dar este referencial. Não digo com suas lições e etc. Mas com a propria existencia deles. De como atraves de suas vidas podemos avaliar as nossas. De como através dos passos que deram tentamos nos livrar ou aprisionar aquilo. Somos feitos em derivação oposta ou similar ao que vemos acontecer dentro de uma intimidade compartilhada.

D says:

ah, entendi...como se vc não quisesse seguir os mesmos "erros"?

Simplesmente, Lauren says:

Exato...achando que sempre vou viver as mesmas cosias.. o eterno retorno, não só de mim, mas deles.

D says:

Ainda presa a amores?

Simplesmente, Lauren says:

Presa a amores, que fazem teias. Não sei se serei algum dia a presa de uma aranha gigante. Mas com certeza não me prendo a magoas. Escrevi isso no blog. Mágoas são para pessoas especiais. Pessoas que conseguem arranhar o espelho de nossas almas, a ponto de fazer com que não possamos mais no ver da mesma forma. A magoa é algo que nos deforma em nossa percepção. Não dá para ter mágoa de tudo. Você se torna amarga. Se houver mágoa, seja da pessoa e não do momento, não da história.

Porque os momentos e as histórias são partes das suas escolhas. Partes de você. E não tem como vc viver se odiante ou tendo raiva de si. O que está feito, está feito. Não tem como mudar.

D says:

isso é de uma complexidade tremenda

Simplesmente, Lauren says:

Pq? Nao acho que seja complexo, mto pelo contrario. Parece exigente pq eh simples

D says:

eu acho complexo pq concordo com tudo isso mas na pratica, na hora da dor mesmo, a gente nao consegue ser tao racional

Simplesmente, Lauren says:

Nao é ser racional

D says:

a gente nao escolhe certas coisas..

Simplesmente, Lauren says:

Exatamente. Nao existe bom e mau. E sim escolhas. E existe uma responsabilidade mto grande nisso e q n deve ser jogada no outro. Vc n faz as coisas forçadas e nem dá para forçar o outro. O que decepciona é a expectativa. E esquecer que O outro nao sou eu”. Não tem como eu fazer o outro, por mais parecido que seja comigo, agir como eu. A frustração reside no fato de achar que o outro vai suprir completamente a suas expectativas

D says:

A frustração reside no fato de achar que o outro vai suprir completamente a suas expectativas

concordo totalmente

Simplesmente, Lauren says:

E nao é assim. O outro também tem as suas escolhas. E principalmente seus medos. Dificilmente levamos em conta a questão do medo, da insegurança. É a questão do livre arbítrio. Por que eu posso fazer o que eu quero e o outro nao? Encarar que o Outro é um ser tão livre quanto eu é a coisa mais dificil. Por isso, eu tenho me preocupado em distinguir o que é amor do que é paixão

D says:?

nem me fala... tenho pensado muito nisso

Simplesmente, Lauren says:

Eu cheguei a conclusão que o amor é mais calmo pq aceita as decisões do outro. Ao contrário da paixão que tudo quer, deseja, não existe o outro, mas sim apenas a realização do meu desejo

D says:

esses dias pensei em escrever para aquela coluna "Eu, Leitora" das revistas femininas. O titulo seria "Casei com a paixão da minha vida. E agora?"

Simplesmente, Lauren says:

Amar é saber abrir mao e continuar gostando. Pois é, paixão da sua vida e não amor. Eu posso dizer que eu havia encontrado o amor da minha vida. Eu tenho um traço dramático e sentimentalista que me leva mais fácil ao amor do que a paixão. Amor é doação e paixão é entrega. Sou racional demais para me entregar

E sentimental suficiente para me doar. Entende a diferença?

D says:

então vc é minha ídola

Simplesmente, Lauren says:

A paixao é dor. Amor é contingencia

Pq idola? Sou um bicho mto ruim. Sou rancorosa e descobri isso com o amor da minha vida. Me fazia sofrer vendo-o em uma angustia infinita e eu, alimentando dores, feridas que pareciam nunca cicatrizar. Ainda o amo. O que demonstra mais uma vez o meu carater contraditório e rancoroso. Mas sei que o amo porque dei meu espaço, é algo absolutamente sagrado. E acho que ele jamais entendeu isso. Dar meu tempo... afff... isso é o de menos... tenho 27 anos. Não estou nem no meio da minha vida... pelo menos cronologica

E também, já quase morri duas vezes

D says:

nossa

Simplesmente, Lauren says:

Sei que o tempo é algo relativo, mas o espaço nao. O espaço é uma dedicação que vc tem apenas com quem vc ama. Por isso é mais facil, para alguns, dar tempo para a paixão. E não o espaço para o amor

Vc arrumar o seu armário para a chegada de alguem, não é simples

Abre os teus armários, eu estou a te esperar

Para ver deitar o sol sobre os teus braços, castos

Cobre a culpa vã, até amanhã eu vou ficar

E fazer do teu sorriso um abrigo

Canta que é no canto que eu vou chegar

Canta o teu encanto que é pra me encantar

Canta para mim, qualquer coisa assim sobre você

Que explique a minha paz

Tristeza nunca mais

D says:

eu adoro essa musica

Simplesmente, Lauren says:

Pois é. É disso que eu estou falando. Dessas pequenas sutilezas, essas pequenas sutililezas que nos conquistam, mas que escondem o peso. É na insustentável leveza do ser é que está o peso da existência. A sutileza mascara, engana... mas é incrivelmente adoravel. A ponto de não se ter palavras exatas para descreve-las. Não há palavras exatas para a paixão. O amor quer e deseja as repetições. Este é o momento que marca a transformação de uma paixão em amor. È de quando as sutilezas apresentadas ficam se repetindo, repetindo... e vc n enjoa nunca. Cada vez que acontece é algo surpreendemente encantador. A paixão, por sua vez, que sempre tudo novo de novo. Com toda esta história louca que aconteceu, voltei um passo a atras na minha existencia e assumo o carater solitário da minha alma. Sempre fui solitária com meus devaneios

D says:

ah, é esquisito falar por msn... Não tenho a capacidade que vc tem de escrever mil frases por minuto

Simplesmente, Lauren says:

como assim?

D says:

eu tenho muitas saudades de vc AO VIVO. Parece que nunca funcionamos à distância. Embora eu saiba que fui eu que me distanciei, também...

Simplesmente, Lauren says:

Pare de se culpar. Lembra do que disse acima. Todos nos temos parcela de culpa nas coisas

sao as escolhas. Continuo amando vc do mesmo jeito que amava quando nos viamos sempre.

D says:

culpa é meu segundo nome hshs é genético

Simplesmente, Lauren says:

vc continuar sendo uma grande amiga e que tem um lugar especial no meu coração. O importante eh que mesmo distante temos dialogos como este. Bonitos. Verdadeiros. Sentimentais.

D says:

com certeza. Precisamos continuar nossa conversa depois

Simplesmente, Lauren says:

Diz uma coisa. Vc se importa se eu der uma mexida no texto que produzimos e colocar no meu blog

D says:

que texto? essa conversa? Claro que não, pode por. Claro que não me importo. Até pq não escrevi quase nada, só você.

Simplesmente, Lauren says:

depois vc entra e ve. Deste jeito vc me deixa como uma falante histerica.. rs

Simplesmente, Lauren says:

BJOS

D says:

vc é uma literata. beijos

quarta-feira, 8 de julho de 2009

A flor

Estava arrumando o armário. Estava a perguntar o por que de tudo aquilo. Tanta coisa. Tanta desorganização. "_ Nunca vou usar tudo ao mesmo tempo." Mas seria mesmo tudo tão desorganizado assim? Seria ela a desorganização em pessoa?
Embora as as blusas, as calças, as saias estivessem relativamente em seus lugares, havia um quê de caos. Até que... em uma das gavetas, estava ela... a flor.
Seu primeiro impulso foi sorrir. Em um breve instante havia sido transportada para uma outra época. De volta ao seu inexistente carro, num estacionamento que já não mais ocupava e com alguém que jamais lhe pertenceu.
Olha o quarto revolto e se dá conta de como o tempo passou. De como vivia agora outra vida. Quantas vida podemos viver dentro de uma mesma vida? - se perguntava silenciosamente. É como se já tivesse sido várias pessoas numa só. Várias histórias numa só. Vida.
A música não é mais a mesma, as fantasias já não são mais as mesmas e nem a cor do seu cabelo é mais a mesma. Só seu nome não mudou.
Muda,calada, ressentida em si mesma. Fechada. É assim que ela deve ser. A solidão é a sua bandeira. Não é melancólio, nem triste. Apenas uma escolha. É um segredo. O segredo de uma vida. Assim como a flor. Um segredo compartilhado com pessoas daquela época, que também não são mais as mesmas de agora.
Pensa em como algo que parecia ser mais algumas frases de impacto tornam-se em algo que se esboça como um conto. Quem conta um conto, aumenta um ponto. Apartir do momento que ela contar a história, ela deixa de ser dela e passa a ser de todos. Uma forma interessante de se perder aos poucos.
Conta que vestida de Rapunzel, com sua longa trança de rosas falsas com um falso príncipe. Viveu o que se diz um momento de mulher e não um momento de felicidade. Em um carro que em menos de dois anos deixaria de existir, assim como este encontro não realizado entre estas falsidades.
Ela passa a mão no cabelo. Doma o cabelo, amarra, como se amarrasse a si mesma. Lembra da música. "Não fique magoada" E não ficou. Não é para ficar. As mágoas são dedicadas à pessoas especiais, é como um cálice de cicuta. Um veneno doce que mata o coração e amarga a alma. A mágoa não é e nem deve ser dedicada a momentos. Estes pequenos fotogramas que nos servem para alimentar a alma e dar um certo consolo de que a existência não é tão inútil assim.
Voltando a cena em questão. Em nada havia de romantismo. Era apenas o falso príncipe falando da sua banda favorita. Olhando para trás não há mágica. Mesmo as entradas e saídas dele em sua vida. Ambiguidades a parte. Um dia que ele saiu, ela resolveu fechar a porta. De vez. Como sempre faz. Fecha a porta, tranca e não olha mais para ela. Pode-se imaginar que a sala da casa dela seja cheia de portas fechadas. Cada uma com o seu formato, cor e material específico. Algumas portas, são um pouco mais frágeis. Talvez, quem saiu por ela pudesse forçar um pouco a entrada e entraria. Mas ela sabe que as pessoas não são bumerangue, não se joga para longe, esperando que volte.
Mas de tudo que ela conta ficou a banda, a música, a história e a flor.
Não havia nada banal, vulgar ou carnal. Mas uma afinidade particular. Não só pelo gosto da banda que tocava no K7 desgastado, mas nas noites a fio que ficavam juntos. Apenas juntos. Aproveitando um da cia do outro, da presença, do abraço.
O olhar dela se perde ao longe. Ela sabe que aproveitou o máximo e usou tudo ao máximo. Tudo era rápido e foi. Fulgaz em relação a ele. E incerto por ela. A ela restou o que entenderia só mais tarde, arrumando um armário.
A fronteira é fina entre o conto de fadas e a novela mexicana piegas. Todos os elementos estão em ambas as coisas. O que dá o tom é a forma de contar. A forma com que se encontravam cada vez.
Ela se pergunta se para ele era da mesma forma. Pergunta impossível de resposta. Haviam outras pessoas que entravam e saiam de sua vida, quanto ele sumia como o Holdini. Com o falso príncipe ela aprendeu a ser mais ludica, a dar espaço para quem e não só que ela quisesse que entrasse em sua vida, o que era estar junto por estar junto. Aprendeu a dormir quando o corpo não suportasse mais. Acordar embrulhada num abraço sincero. Eram as melhores coisas de se estar com alguém.
A graça da vida não estava na realidade, naquela que explicamos com senso comum, facilmente. metas fazem parte, mas não são nada sem o sonho. Os planos não podem se concretizar se não tiver um pouco de insanidade, um pouco de esforço para ir além.
O gosto do café e do cigarro na madrugada. Lembra-se em seguida de como foi inexplicável e ainda é o ditado popular: dois bicudos não se beijam. Por que duas pessoas de natureza parecida e encaixada não podem dar certo? Por que parece sempre faltar alguma coisa?
Talvez uma resposta para esta pergunta se esboça. É porque este outro deixa de ser o não eu e passa a corresponder a um eu, externo. Daí fica dificil aceitar atitudes que não seriam parecidas ou as mesmas que a sua.
A nossa heroína não se desgasta perguntando além disso, pois nunca precisou de mais fantasmas em sua cabeça, além dos que já possui. Ela própria já é uma casa mal assombrada, mas que seja pelo menos de um parque de diversão.
Aprendeu o que havia para se aprender. Se guardou desde o dia que se fechou a porta. Agora, espera de frente com uma porta aberta uma figura tomar conta de seu olhar, do centro do espelho e do lado vazio da sua cama. E tudo ficará para trás. Assim como a flor que ela encontrou perdida no meio de sua bagunça. A flor que deu de volta a ela a mensagem que precisava neste momento.
Ela pega a flor e se dá conta que a vida é um grande ensaio. Coisas dão certo, outra também. Mesmo no ensaio de uma relação. Num esboço de um amor. No início de uma paixão. A vida dá e a vida toma. Tudo se torna apenas uma questão de como viver estas coisas enquanto estão acontecendo. Depois, tudo vira caracteres. Não importa a ela saber se foi amada, porque também não soube amar. E se pergunta se algum dia saberá amar.
Agora o espaço do armário está arrumado. Espera a chegada de roupas novas e das malas. Como seu coração desorganizado tem um espaço para a chegada do principe de verdade.

2 com 2 são 5

O rio não precisa do mar. Mas o mar, mesmo em sua imensidão precisa do rio. Por que afinal o rio tem que correr para o mar? Descarta-se a idéia de que o rio é apenas mais um?
O rio quando dessagua no mar quase desaparece. O rio pode chorar. Pode chorar desanguando no mar ou num deserto. De qualquer forma suas águas são inuteis.
Talvez o foco esteja demais onde o rio acaba, não por onde ele passa. O rio ainda existe em seu percurso.
Pensando no encontro do rio com o mar num determinado ponto vê-se do que estou a escrever. As aguas do mar e do rio não se misturam, mas provocam um fenomeno. Um evento único. Agua salgada e agua doce percorrem lado a lado, cada um o seu destino. E isso não quer dizer que se atravessem. Seguem em paralelo. E isso também não quer dizer que seja na mesma direção. O fato é que não se tornam uma coisa só. Criam uma terceira. Algo que só é possivel observar naquele momento e naquele ponto específico. É o espaço e tempo da vida.
Para se construir usinas de força tem que se canalisar o rio, represá-lo. Colocar a força que antes ia para o mar, para outro lugar. As consequencias são terras ferteis de baixo d´água, submerso. Metros e metros da superfície. Elimina-se o que antes tinha de selvagem, de intocado ou até mesmo construções já edificadas. Até isso é destruição em prol de uma ação racional e de mais pura necessidade. O desejo não cabe mais nestas relações de curso e percurso do rio. É a vontade alheia.
Sigo escrevendo em nome do rio porque é o que me resta. O rio que antes transbordava espontaneamente por si mesmo, agora se recolhe. É época de seca. Em seu leito suas forças se esvaem. Assim como as palavras que surgem tão lentamente esta madrugada. Não sou capaz de ir muito mais além do que está aqui. Assim como o rio que perde a sua força para chegar até o mar. Tudo é igual. Tudo se repete. O longe e o perto, alegrias e tristezas. A mesma lua cheia.
Isso pode parecer perturbador, triste, depressivo. O pensamento parece se deslocar por vários pontos. Assim que evoco uma coisa, uma metafora, ela me devolve a realidade. Há um acúmulo de vontade que me sinto como o rio represado, contida.
Na verdade, nos ultimos dias tenho sido tomada de uma dúvida. Não sei se serei capaz de terminar esta história. Porque tudo é incompatível com a linguagem. Na medida que a história resiste as palavras e a sua ordem, é a medida exata de quão perto cheguei de inscrever a metáfora no coração. E quando chega o momento de inscreve-la, a coisa mais importante (supondo que ainda exista), talvez não seja mais capaz.
O tempo do rio acontece. Como já foi dito, o seu leito foi mudado. E só agora percebo o quanto. O ato de escrever é como manter esta ferida aberta para cicatrizar. Quem sabe a dor não saia catarticamente pela pressão dos meus dedos no teclado. E assim o rio poderá desaguar suas águas em turbinas para produzir energias.

terça-feira, 7 de julho de 2009

O inventor da solidão


Lentamente começo a compreender o absurdoa da tarefa que me propus. tenho a sensação de tentar ir a algum lugar, como se soubesse o que queria dizer, mas quando mais avanço maior a certeza de que o caminho para chegar ao objetivo não existe. Preciso inventar a estrada a cada passo, e isso significa que nunca tenho certeza de onde estou. Uma sensação de mover-me em círuclos, de refazer eternamente o mesmo caminho, de seguir em várias direções ao mesmo tempo. E, mesmo que eu faça algum progresso, não estou de modo algum convencido de que chegarei aonde penso que estou indo. Só porque você vaga pelo deserto não quer dizer que exista a terra prometida.

{Paul Auster}

segunda-feira, 6 de julho de 2009

A ausência

Se há ausência do outro; é o outro que parte, sou eu que fico. O outro vive em estado de partida, de viagem; ele é por vocação, migrador, quanto a mim, que amo, por vocação inversa, sedentário, imóvel, disponivel, à espera, ficando no lugar. [....] A ausência amorosa só tem um sentido, e só pode ser dita a partir de quem fica - e não de quam parte: EU, sempre presente, só se constitui diante de VOCÊ, sempre ausente. Dizer a ausência é, de início, estabelecer que o sujeito e o outro não podem trocar de lugar. [...] Às vezes consigo suportar bem a ausência. Sou então "normal". Me igualo à manera pela qual "todo mundo" suporta a partida de um "ente querido", obedeço com obediência com competência à educação pela qual me ensinaram desde cedo a me separar. Ajo como um sujeito destemido; sei me alimentar; ENQUANTO ESPERO..."

{Fragmentos de um discurso amoroso - Roland Barthes}


Poema das Mãos - Monólogo por Bibi Ferreira

domingo, 5 de julho de 2009

A pipa e o menino

Pipa. Linha. Menino.
A pipa na mão do menino voa. Brinca. Dança no céu azul.
O menino corre levando a pipa. A pipa que dança no céu azul.
A linha esticada nas mãos do menino dita o movimento da pipa.
No céu azul a pipa contrasta com a luz do sol. Dança, tremita.
Em suas mãos a pipa vai e volta, volta e vem.
No alto, o menino para a pipa em suas cores. O menino dá linha, a pipa sobe... tão pequena na imensidão azul e branca. Um ponto no céu, foi para onde não se pode distinguir suas cores e forma. A pipa parece mais um complemento às nuvens tão brancas.
A linha esticada é puxada. A pipa quase cai. A imrpessão de queda e a proximidade com o chão faz com que a pipa se desconcerte. Mas o menino habilidoso em sua arte, devolve aos poucos a pipa ao céu. O menino consegue manipular a pipa, a desvia aos poucos dos ventos pouco favoráveis.
O vento causa turbulência. A linha firme nas mãos do menino a leve além. A leva sem medo. Obstinado. Mas a pipa está em contradição, se agita. Às vezes consegue fazer os movimentos comandados pelo menino, ora se se abala com o vento.
O céu não parece mais um lugar seguro. Não aquele pedaço de céu. O menino parece não perceber a fragilidade da pipa. Ou parece terr um prazer sádico em quase destruí-la. Em voos cada vez mais ousados, o menino ordena a pipa, força. Mas e a pipa? E a sua vontade? E a sua vontade?
A pipa tenta mostrar que não está conseguindo. Seus limites estão postos. Os voos tem seu declínio. A pipa manca em seu voo. A linha amarrada começa a esgarçar. E menino não percebe.
O menino tão entretido com a brincadeiram, em sua gana, com o desafio provocado pela pipa. Ri. Corre. E o fio, por sua vez, se esgarçando. O vento recomeça.
O que aconteceria com a pipa?
A pipa ao se soltar do fio, alcaçará seu voo solitário. Em algum momento poderá cair. A dor do fio se rompendo seria maior do que o encontro com o chão? Creio que uma coisa está implicada com a outra. Mas será a sua queda sem o menino. Sem o fio, ela não deixará de ser uma pipa colorida no céu. Sem o fio ela é perdida e achada.
Ao menino restará o fio. Mas ele também não deixará de ser menino e o fio poderá ser amarrado a outra pipa.

sexta-feira, 3 de julho de 2009

As águas

Na praia inicial de minha vida vejo no horizonte a vida que está por vir. Não é a toa a conjunção de elementos em mim. O fogo de meu signo solar, a água de minha santa de cabeça (Iemanjá), o vento que preciso para as minhas velas e a terra para meus pés. Tudo é a vida que se origina e se desemboca em mim. Mas que as vezes este ciclo precisa do entre. O rio não é rio se não tiver seus afluentes. E todo mar tem seu rio. A espera pelo mar. Mas as vezes há o esquecimento de que eu mesma sou um rio. E não um rio que passa pela vida, mas a vida própria e que tem em si seu movimento, seu ecossistema. Talvez tudo isso seja mais uma demonstração de que as coisas vem de dentro para fora e não de fora para dentro. Mas também pode ser exatamente o contrário, em dizer que tudo está interligado. Tudo e o nada estão no eterno retorno. O retorno.
Não há desamparo, nem sentimento oceanico. Há apenas a constatação de que a vida é muito maior do que os processos da água que aprendemos nas aulas de ciencia. Evaporação. Condensação. Sublimação. Mais... mto mais... são as águas que revolvem em mim. Guardo traços. tenho marcas e veios. Apesar de ser menina, descubro que sou um rio. Nada parecido com algo nas dicotomias de bom e mau, sou apenas o que sou. Gostaria de ter o poder de invocar os ventos e mudar o rumo. Mas como um rio pode mudar de lugar.... faço do risco de viver meu alimento. Não há mau ou bom tempo, há vida, há a agua. A diferença entre o mar e o rio é que um é doce e outro salgado. Um é pequeno e outro é grande, imenso. Mas em sua pequinez o rio mostra as possibilidades de navegação e acaba por desembocar no mar. E o mar, por sua vez, tem sempre um rio para lhe alimentar. aprendo com isso que nada sei sobre o mar, e nada sei sobre mim. e já não temo nada. Enfrento tudo de peito aberto. Tudo pode ser sede, posso querer tomar goles grande para aplacar a garganta seca. As coisas voltam para o mesmo lugar, estou presa a minha existência, a minha vida. Tenho que bebe-la mesmo quando não tenho mais sede. Pode ser enfadonho as vezes, mas não acredito ser feliz vivendo outra vida que não fosse a minha.

quinta-feira, 2 de julho de 2009

Queria poder dizer...

queria poder dizer o quanto amo
queria poder dizer o quanto a presença queima em mim
queira poder dizer o quanto estou numa paz estranha
queria poder dizer o quanto meus olhos estão fixos no horizonte
queria poder dizer o quanto parece que meu mundo está suspenso
queria poder dizer o quanto me sinto como um Cd pausado na música favorita em repeat
queria poder dizer o quanto cada suspiro que dou procura o seu cheiro que aos poucos se desfaz no ar
queria poder dizer o quanto o seu abraço ainda queima em meus braços
queria poder dizer o quanto a emoção ainda me toma
queria poder dizer o quanto desejava ter asas para ir voando até vc
queira poder dizer o quanto o dia está cinza e o sol se escondeu
queria poder dizer coisas que as palavras não dão conta
queria poder dizer o que não é possível dizer sozinha
queria poder dizer o quanto a minha voz fica estranha sem os seus ouvidos
queria poder dizer o quanto despero me dá a sua ausência
queria poder dizer quanta alegria me invade quando eu te vejo
queria poder dizer o quanto sinto falta dos seus beijos, mesmo depois que vc tenha me beijado
queria poder dizer o quanto desconjuntada eu fico com a sua existencia na minha vida
queria poder dizer o quanto eu tenho fé
queria poder dizer o quanto em mim tem mudado por vc, com vc e para vc
queria poder dizer o quanto eu trocaria a eternidade por aquela noite
queria poder dizer o quanto eu andaria para te ver
queria poder dizer o quanto de nostalgia me invade
queria poder dizer o quanto de cisne que há em mim
queria poder dizer o quanto de insanidade ferve em mim quando estou contigo
queria poder dizer o quanto de paixão me consome quando estou longe
queria poder dizer o quanto as lembranças me ajudam a passar estes dias compridos.
queria poder dizer o quanto forte é a sua imagem quando fecho os olhos
queria poder dizer o quanto o vazio está cheio, e o cheio está vazio

queria poder dizer tanta coisa, mas tudo se forma e se desmancha. A voz não sai. Ela não tem sentido no silêncio que me rodeia. Só me resta escrever. Transformar em caracteres. É a estranha felicidade da solidão povoada por você.
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©2007 '' Por Elke di Barros